Lei de Incentivo à Reciclagem: entenda o potencial do mecanismo


Criada em 2021, a Lei de Incentivo à Reciclagem ganhou alterações importantes com a derrubada de vetos presidenciais em agosto de 2022. Agora, mais tipos de projetos de incentivo à reciclagem podem ser apoiados financeiramente com dedução no IR — num país onde o índice médio de reciclagem é de 3% para a fração seca e de 1% para o resíduo orgânico (Abrelpe). 

Em todo mundo, mais de 15 milhões de pessoas trabalham com a coleta, a triagem e a reciclagem de resíduos, segundo um estudo da Organização das Nações Unidas e da Organização Internacional do Trabalho. No Brasil, há cerca de 800 mil agentes ambientais, conhecidos como catadores de lixo reciclável, em atividade, segundo levantamento do Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis. Pelo menos 70% desses trabalhadores são mulheres. 

Apesar desse número significativo de mão de obra e do potencial econômico que representa, a reciclagem ainda não recebe o devido incentivo governamental e privado em nosso país, um cenário que pode ser transformado com a Lei de Incentivo à Reciclagem e as mudanças que ela recebeu em 2022, como mostramos a seguir.

O que é a Lei de Incentivo à Reciclagem?

O mecanismo, criado pela Lei Federal no. 14.246/21,  também conhecida como Lei de Incentivo à Reciclagem, estabelece incentivos fiscais e benefícios a projetos que estimulem a cadeia produtiva de reciclagem e fomentem o uso de matérias-primas e insumos de materiais recicláveis e reciclados, como prevê a Política Nacional de Resíduos Sólidos. 

Mas até agosto deste ano, a lei autorizava somente a constituição de Fundos de Investimento para Projetos de Reciclagem (ProRecicle) sem personalidade jurídica.

O que mudou na Lei de Incentivo à Reciclagem em 2022? 

Em agosto de 2022, o Congresso Nacional derrubou vetos presidenciais da Lei de Incentivo à Reciclagem. Agora, ela estabelece que pessoas Físicas e Jurídicas apoiem financeiramente, em troca da dedução no IR, projetos nas seguintes áreas:

  • de capacitação, formação e assessoria técnica a projetos que busquem promover, desenvolver ou fomentar atividades de reciclagem;
  • incubação de microempresas, de pequenas empresas, de cooperativas e de empreendimentos sociais solidários que atuem em atividades de reciclagem;
  • pesquisas e estudos que estudem a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos;
  • implantação e adaptação de infraestrutura física de microempresas, de pequenas empresas, de indústrias, de cooperativas e de associações de catadores de materiais reutilizáveis e recicláveis
  • aquisição de equipamentos e veículos necessários a todo o ciclo de reciclagem de materiais por pequenas empresas, cooperativas e associações de catadores;
  • organização de redes de comercialização e cadeias produtivas;
  • capacitação e fortalecimento de agentes ambientais na cadeia de reciclagem;
  • desenvolvimento de novas tecnologias para o setor.

Com a derrubada dos vetos, a lei estabelece o patamar máximo de dedução do Imposto de Renda de até 6% para Pessoas Físicas e até 1% para Pessoas Jurídicas tributadas com base no Lucro Real, nos cinco primeiros anos após a produção de efeitos da lei. 

A derrubada dos vetos se soma a outros instrumentos aprovado nos últimos anos para favorecer o mercado da reciclagem: 

  • O Certificado de Crédito de Reciclagem – Recicla+, regulamentado pelo Decreto Federal no. 11.044/2022. Esse certificado é gerado por organizações que reciclam e pode ser comprado por empresas que não têm sistema próprio de logística reversa. 
  • O Plano Nacional de Resíduos Sólidos (Planares), que estabeleceu metas para a reciclagem de materiais e bom proveito de resíduos para os próximos 20 anos.

Por que a Lei de Reciclagem pode transformar a reciclagem no Brasil?

Embora o Brasil produza, anualmente, 82,5 milhões de toneladas de resíduos sólidos urbanos – sendo 33,6% de materiais que podem ser reciclados —, apenas 3% da fração seca desse resíduo é reciclada. No resíduo orgânico, o índice é de 1%. 1.500 municípios não contam com coleta seletiva. Com esse baixo índice de reciclagem, estima-se que nosso país perca cerca de R$14 bilhões anualmente. Os dados são da Abrelpe (Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais). 

Para se ter uma ideia de quanto ainda precisamos avançar, Chile, Argentina, África do Sul e Turquia têm um índice médio de reciclagem de 16%. Na Alemanha, 67% do lixo é reciclado, como apontam dados da ISWA (International Solid Waste Association).

As mudanças na Lei de Reciclagem trazem perspectivas de avanços no setor pois um dos grandes entraves para que a reciclagem tenha melhores resultados em nosso país é a logística. Afinal, a venda dos recicláveis não cobre todos os custos do processo de coleta seletiva, exceto no caso do alumínio. 

Entre os motivos para isso está o fato de que muitas cooperativas que segregam e prensam materiais não têm, nas proximidades, usinas de beneficiamento, o que as obrigam a transportar todo o material para locais distantes. Além disso, muitas prefeituras não têm infraestrutura para que os materiais retornem ao ciclo produtivo. 

Segundo o diretor presidente da Abrelpe e da ISWA, Carlos Silva Filho, em entrevista ao portal Ecoa, “a desoneração vai incentivar iniciativas que podem estruturar a cadeia de forma profissional, de negócio, não de forma assistencialista.” 

Assim, a Lei da Reciclagem oferece um estímulo direto a agentes ambientais (catadores), cooperativas, associações, projetos e capacitação e educativos que há tanto tempo têm agido por um futuro mais sustentável em nosso país. Com apoio a essas iniciativas, a Lei pode fomentar projetos inovadores, gerar iniciativas socioambientais, capacitar mão de obra e aquecer a economia.